Chegar à marca de 1.000 publicações no Instagram é um momento especial, e decidimos celebrá-lo com uma entrevista especial que há tempos tenho como objetivo. Quando comecei a acompanhar mais de perto o padel, rapidamente a cidade de Alegrete – RS começou a aparecer com destaque. De lá saíram muitos dos talentos brasileiros que são referência em nosso esporte. Mas além do nome da cidade, o nome de uma pessoa em especial também se repete a cada depoimento destes atletas. Reconhecida por sua singular habilidade como “descobridora de talentos” do padel, ela tem uma trajetória que inspira tanto atletas quanto amantes do esporte.
Vera Lúcia Palma de Freitas, ou simplesmente Tia Vera, é uma educadora física com especialização em ciências do esporte e voleibol, mas foi no padel que encontrou sua verdadeira paixão e propósito. Desde 1994, quando começou a jogar, e especialmente a partir de 1997, quando passou a dar aulas, Tia Vera tem se dedicado a formar não apenas grandes atletas, mas também grandes pessoas.
Seu método de iniciação ao padel é reconhecido por sua eficácia e é utilizado nos programas de treinamento do Match Point, clube em que Tia Vera dá suas aulas. Por meio dele, surgiram atletas de renome nacional e internacional, como Lucas Campagnolo, Stefano Flores, João Pedro Flores, Gabriel Almeida, Martina Rodrigues e muitos outros.
Além de revelar talentos, Tia Vera já treinou a Seleção Brasileira Feminina de Menores, conquistando o vice-campeonato sul-americano em 2016. Hoje, ela segue trabalhando em Alegrete, cidade gaúcha que se tornou um celeiro de talentos graças, em grande parte, à sua dedicação e paixão pelo esporte.
Na entrevista a seguir, o Super Padel conversou com a educadora, para saber mais sobre a trajetória, os desafios e os métodos que fazem de Tia Vera uma figura tão marcante na história do padel brasileiro.
Sobre a trajetória pessoal e profissional
Tia Vera, como foi o seu primeiro contato com o padel e o que a levou a se apaixonar pelo esporte?
Tia Vera: Conheci o padel por meio de um convite do Cezar Flores (pai do Stefano), meu cunhado. Ele era presidente de um clube aqui na cidade. Tenho especialização em voleibol, que sempre foi minha paixão, mas depois de tantos convites, resolvi conhecer o esporte e não parei mais.
Você começou como atleta em 1994 e depois passou a dar aulas. Qual foi o momento decisivo para essa transição?
Tia Vera: Eu jogava (ou pelo menos tentava, risos). Então, um grupo de pessoas resolveu construir um clube com quatro quadras e me convidaram para dar aulas. Na hora, não aceitei, porque, como professora de Educação Física, sempre fui muito organizada, e dar aulas sem nenhum conhecimento sobre o esporte me assustava. Após muita conversa, aceitei e fui buscar conhecimento. Fui a Buenos Aires fazer um curso com o Nicolini (Jorge Nicolini).
O que motivou a criação do seu método de iniciação ao padel? Qual foi a maior dificuldade no início?
Minha preocupação sempre foi o aspecto educacional: primeiro formar pessoas, depois atletas. Não existe bom atleta sem um bom caráter.
Tia Vera: Eu achava as aulas muito estáticas, fora da realidade do jogo. Resolvi adaptar os exercícios do vôlei para o padel, e deu certo. Em três anos, já tinha sete meninos na seleção de menores. Então, comecei a desenvolver um método lúdico para os pequenos de 4, 5 e 6 anos, e daí surgiram grandes atletas. Minha preocupação sempre foi o aspecto educacional: primeiro formar pessoas, depois atletas. Não existe bom atleta sem um bom caráter. Sobre dificuldades, não tive muitas. Meu trabalho com voleibol já me dava credibilidade. Com uma equipe escolar, coloquei atletas na Sogipa, União, UCS e até na seleção brasileira sub-16.
Sobre o trabalho como treinadora
Só para atualizar o público, nos fale alguns nomes importantes do padel que já passaram por treinamentos contigo.
Tia Vera: Muitos atletas já treinaram comigo. Vou citar alguns: Natália Caviquioli, Mirelle Palma, Martina Rodrigues, Estela Soares, Rafaela Fouchard, Thiago Freitas, João Pedro Flores, João Gabriel Martini, João Pedro Pereira, Gustavo Flores, Igor Souto, Iago Souto, Diogo Rodrigues, Antonio Neto, Gabriel Almeida, Lucas Campagnolo, Fernando Zinelli, Guilherme Zinelli, entre outros. Todos jogaram ou jogam na Seleção Brasileira.
Muitos jogadores de ponta, como Lucas Campagnolo e Stefano Flores, citam seu nome ao contar a história de suas formações. Como você identifica e lapida esses talentos?
Tia Vera: A primeira observação é sobre como eles se portam em relação ao esporte. Com 4 anos, por exemplo, já dá para avaliar a parte motora, como brincam com a bola (a intimidade com ela) e o entusiasmo com o que estão fazendo. A partir daí, vamos observando o desenvolvimento individual da criança, mas sempre trabalhando em grupo.
Você treinou a Seleção Brasileira Feminina de Menores em 2016, conquistando o vice-campeonato sul-americano. Como foi essa experiência?
Tia Vera: Treinar a seleção foi uma experiência diferente, mas muito gratificante pelo carinho que recebo até hoje, tanto das meninas quanto dos meninos que faziam parte do grupo. Profissionalmente, não faria parte novamente.
Sobre o método e segredos do sucesso
Em sua opinião, quais são as qualidades essenciais que um atleta de padel precisa desenvolver desde cedo?
Tia Vera: As qualidades principais são foco, disciplina e, principalmente, humildade.
Há alguma história de superação ou evolução de algum atleta em especial que tenha marcado você ao longo dos anos?
Tia Vera: Eu cito todos os atletas que moram fora do eixo central do padel. Viajar de Alegrete até Balneário Camboriú, Curitiba, São Paulo etc., saindo na quinta-feira e voltando no domingo, passando noites nas estradas para não faltar às aulas, é desafiador. Há também a superação das famílias com os custos de patrocínio, principalmente para os menores que viajam quase todo fim de semana em busca de pontuação.
Sobre Alegrete e o celeiro de talentos
Alegrete é conhecido como um celeiro de talentos no padel. Quais fatores você acredita que contribuem para isso?
…buscávamos as crianças em casa e as devolvíamos aos seus lares. Faço isso até hoje. É um trabalho feito com carinho, dedicação e apoio das famílias.
Tia Vera: Isso se deve a um trabalho iniciado em 1994, quando buscávamos as crianças em casa e as devolvíamos aos seus lares. Faço isso até hoje. É um trabalho feito com carinho, dedicação e apoio das famílias. Muitas vezes, lotava o carro com a gurizada e saíamos para jogar nas cidades vizinhas. Além disso, busquei conhecimento com profissionais como Nito Brea e Gervásio Del Bono, que me deram base para montar minha forma de dar aula.
Como você avalia a infraestrutura de Alegrete para a prática do padel atualmente?
Tia Vera: A infraestrutura é boa. Temos quatro clubes, totalizando 11 quadras, para uma cidade de 70 mil habitantes.
A influência argentina é um diferencial para os atletas de Alegrete? Você sente isso no desenvolvimento técnico dos jogadores?
Se fosse apenas pela influência argentina, outras cidades fronteiriças teriam mais atletas do que nós. O diferencial está no tipo de treinamento.
Tia Vera: A influência argentina é inevitável. Antes, era mais evidente. Hoje, com a evolução da preparação física, o jogo está muito mais rápido, e precisamos acompanhar essa tendência mundial. No entanto, se fosse apenas pela influência argentina, outras cidades fronteiriças teriam mais atletas do que nós. O diferencial está no tipo de treinamento.
Você desenvolve um projeto social muito interessante em Alegrete. Pode nos contar um pouco sobre ele?
Tia Vera: Nós desenvolvemos um projeto social junto com a Fundação Lins Ferrão e a Prefeitura Municipal. Atendemos 20 crianças carentes de escolas da periferia. Estamos indo para o terceiro ano de funcionamento. O feedback é maravilhoso: as crianças criaram hábitos de organização, melhoraram a coordenação motora da maioria, e, com isso, também as atividades escolares. Trabalhamos educação para esperar a vez, tratar os colegas com respeito e muito mais. Selecionamos uma menina para treinamento, e a evolução dela é fantástica.
Curiosidades e motivação
Existe alguma rotina ou hábito especial que você passa para os seus alunos e acredita ser essencial no treinamento?
Tia Vera: Rotina… Estudos em primeiro lugar. Os pequenos têm que ter boas notas para continuarem treinando. Existe um acompanhamento de todas as questões que envolvem o entorno do padel, e estamos sempre conversando com eles. Na parte técnica, procuramos sempre focar onde não está bom.
Como é o apoio aos atletas e como isso impacta o desenvolvimento deles?
Tia Vera: Tem algumas empresas que apoiam individualmente atletas.
Encerramento
Qual é a sua maior realização até hoje como educadora e treinadora no padel?
Minha maior realização como educadora é ver o Lucas se destacando a nível mundial e sempre lembrando como começou e com quem começou.
Tia Vera: Minha maior realização como educadora é ver o Lucas se destacando a nível mundial e sempre lembrando como começou e com quem começou. As atitudes dele me enchem de orgulho, e sou a fã número 2 dele. As primeiras são Marilene (mãe), Raquel (irmã) e Duda (esposa)… kkk. É ter espalhado pelo Brasil atletas de nível elevado, como todos os que mencionei, e mais alguns que não fizeram parte de seleções, mas jogam um padel maravilhoso também. E é claro, tenho orgulho enorme de ter meus filhos, Thiago e Mirelle tendo o padel com profissão.
Que conselhos você daria para jovens que estão começando no esporte e sonham em se tornar atletas de alto nível?
Tia Vera: Não desistam na primeira derrota. Tracem um objetivo e lutem para alcançá-lo. Quando o alcançarem, estabeleçam outro, mais distante, e assim por diante… até chegarem lá.
Para finalizar, que mensagem você gostaria de deixar para os leitores do Portal Super Padel e para os futuros talentos do esporte?
Tia Vera: Aproveitem este esporte maravilhoso. Façam dele sua bandeira, porque é um esporte transformador.
Maycon Henschel, da redação.